ENTREVISTA COM GASTON SANTI KREMER

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Empreendedorismo social é opção para “geração com propósito”, aponta analista internacional

Se você é daquelas pessoas que querem fazer do seu trabalho um legado para o mundo, certamente irá se identificar com nosso entrevistado. O analista internacional Gaston Santi Kremer trabalha há mais de 5 anos com empreendedorismo social, mas possui experiência na gestão pública, em empresas privadas e até como mediador de eventos de artes. Formado em RI pela Unilasalle-RS, cursou Ciências Sociais na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), e mestrado em RI pela Universidad Nacional de Rosário, na Argentina, embora não tenha concluido o programa.

Sua opção por cursar RI foi a vontade de mudar o mundo, o que não parou só nos estudos. Atuou profissionalmente na Green Social Bioethanol, empresa que projeta, desenvolve e instala micro-destilarias de etanol, proporcionando às pessoas acesso a recursos energéticos limpos e seguros. Hoje trabalha na WTT – World-Transforming Technologies, fundação com o propósito de criar negócios de impacto (empreendedorismo social) centrados na inovação tecnológica que possam gerar e escalar soluções para grandes desafios sociais e ambientais. “Existe uma miríade de problemas para serem resolvidos”, comenta Gaston quando questionado sobre o mercado de trabalho em empreendedorismo social e para analistas internacionais.

Confira abaixo a entrevista completa.

Por que você optou por estudar Relações Internacionais?

Sempre fui idealista com o sonho de “mudar o mundo”. Pai advogado e mãe arte-educadora, combinação explosiva. Achei que ia seguir os passos dele, mas com poucos meses de finalizar petições e percorrer alguns fóruns desisti da ideia. Pensei em Psicologia, História, Ciências Políticas e finalmente me encontrei em Relações Internacionais. Explorar a grade curricular do curso foi a chave para me decidir. É o curso perfeito para estudar com prazer! Entrei com a vaga ideia de ser diplomata, o que foi se dissipando aos poucos durante o curso.

Poderia nos contar sobre a sua formação acadêmica?

Fiz o primeiro vestibular com baixíssimo comprometimento, estava focado em me despedir com alegria dos colegas do colégio (alguns por quase 15 anos). Mesmo uma média suficiente pra passar em ADM, Economia e outros cursos legais não me permitiu entrar em RI, que na época disputava com Medicina a média mais alta entre os cursos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Fui para a opção B. Estudei na Unilasalle, o primeiro curso de RI do RS, sob a tutela do grande professor senegales Alfa Oumar Diallo. No meio do curso senti falta de ter um conhecimento mais específico (grande lacuna do nosso curso, onde focar em áreas específicas depende muito da estrutura e oferta de disciplinas pela faculdade). Optei por Ciências Sociais na UFRGS, com a intenção de estudar política. Muito chato! Acabei gostando de Antropologia, mas descontinuei o curso após passar na fácil seleção de mestrado da Universidade Nacional de Rosario na Argentina (UNR), onde cursei Integração e Cooperação Internacional. Acabei lá porque havia pesquisado a Visão de Autonomia na Política Externa Brasileira. A UNR era a casa de Carlos Puig, precursor dos estudos de Autonomia na América Latina junto a Helio Jaguaribe. Na volta ao Brasil ainda tentei voltar a UFRGS, mas não aguentava mais estudar teorias, sentia falta de pessoas e seus problemas de forma mais clara nos meus estudos.

Gostaríamos que você nos contasse sua trajetória profissional e de que forma os seus estudos contribuíram para ela.

Durante a faculdade, por acreditar que teria desvantagem em relação aos colegas da UFRGS, decidi que iria focar em fazer os melhores estágios e me conectar com as questões práticas atinentes a grande esfera de atuação dos internacionalistas. Infelizmente, Porto Alegre não oferece muitas opções, felizmente pude dar check na maioria delas. Fui estágiário na antiga Secretaria de Desenvolvimento e Assuntos Internacionais do Estado, na Gerência de Comércio Exterior do Banco do Brasil, de Business Operations da DELL e ainda fiz trabalhos voluntários para a Embaixada Argentina em POA, para a Cruz Vermelha e para a ONG Amigos da Terra. Não tenho duvidas que essa visão prática me trouxe algumas vantagens. Fui correr atrás de uma profundidade academica maior no Mestrado, o que sinceramente não me trouxe muito prazer. Acho muito importante, hoje em dia, não emendar a graduação na pós. Aproveitei menos o mestrado por isso! Voltei da Argentina e comecei a trabalhar do Centro de Negócios Internacionais da FIERGS, onde minha experiência internacional foi muito útil! Lá aprendi muito sobre aspectos de Comércio Internacional relativo à negociação e certificações internacionais. Mas o principal aprendizado foi com colegas muito experientes e também com burocracias muito engessadas. Nesse momento da minha carreira busquei uma mudança abrupta, e aproveitando que o tema da Bienal de Artes Visuais do MERCOSUL foi Geopoética, discutindo fronteiras, territórios e identidades, me desliguei da FIERGS e fui me testar como mediador no grande evento de artes. Foram meses deliciosos de contato muito intenso com pessoas muito diversas, um aprendizado muito rico!

E a sua experiência na Green Social Bioethanol?

Quando o amor fugaz com a Arte Educação chegou ao fim, me vi perdido. Ainda estava pesquisando PEB agora com interesse em crescimento econômico africano e as relações com Lula. Um grande amigo, engenheiro Bruno Mallmann, me comentou que ele e seu pai estavam com uma Start Up que se relacionaria primordialmente com África subsaariana e América Latina e queria que eu ajudasse nas negociações. Assim comecei a trabalhar na Green, uma born global dedicada a espalhar uma inovadora tecnologia de Micro Destilaria de Etanol com foco em acesso a energia e desenvolvimento rural. Meu dia-a-dia consistia em estabelecer pontes entre funders, técnicos e organizações no campo. Um dia típico poderia ter uma call com o CIDEV do Banco Mundial pela manhã e a tarde visita a um assentamento do MST em Hulha Negra, sul do RS. Ainda tinha o trabalho de preparar propostas para clientes, entender os critérios técnicos e sociais das demandas de países como Togo, Etiópia, Nigéria, Moçambique, Uruguay e Guiana, por exemplo.

Clique aqui e conheça mais sobre a Green Social Biothanol.

Agora você está na WTT – World-Transforming Technologies. Poderia nos contar o que é, qual a sua função e rotina?

WTT é uma fundação que busca desenvolver modelos de negócio e inovação onde tecnologias estejam no centro do impacto socioambiental. Nesse sentido, trabalhamos em duas linhas principais: apoio a tecnologias disruptivas, tanto financeiro como de alavancagem e construção de pontes com outros stakeholders chave; e com programas de pilotos de tecnologias em contexto de impacto. Nesse sentido, estamos diretamente envolvidos, por exemplo, na Aliança água+acesso (http://www.tratabrasil.org.br/bnb-e-coca-cola-vao-investir-r-20-milhoes-em-projetos-de-acesso-a-agua-no-nordeste), com parceiros como Instituto Coca, Banco Do Nordeste, Trata Brasil, Fundação Avina e outros importantes parceiros de impacto.

Meu papel, além de vislumbrar e contruir parcerias de impacto, é o de mediar tecnologias com comunidades beneficiadas. Adaptabilidade cultural ainda é um dos desafios chave para a entrada de tecnologias em contextos emergentes! Minha rotina na WTT é de trabalho remoto, com frequentes viagens a São Paulo para reuiões com parceiros e o time, além é claro de visita a comunidades do semiárido e diferentes regiões amazônicas.

De onde veio o seu interesse por Empreendedorismo Social?

O Empreendedorismo Social veio até a mim com a oportunidade da Green. Tinha feito um curso de empreendedorimo sustentável, com uma organização muito legal, com a qual tive o prazer de fazer uma consultoria depois, a Semente Negócios, nos idos de 2011. No entanto, o interesse veio realmente através do trabalho de consolidação da Green.

O que você poderia nos dizer sobre mercado de trabalho na área de Empreendedorismo Social?

É um mercado em franca expansão, principalmente pelo chamado da nossa geração a estar mais conectado com um propósito. Ao mesmo tempo é também notável o número de executivos de grandes multinacionais, em qualquer setor, que se perguntam qual seu legado para o mundo. E assim como RI, tédio não é uma opção, pois grandes desafios não faltam! Existe uma miríade de problemas para serem resolvidos.

Poderia nos dizer os pós e contras de trabalhar nessa área?

É uma área que vem se consolidando, mas que já possui players com trackrecord. Destacaria Ashoka, Artemisia, Semente Negócios, no lado de apoio a empreendedores, a possibilidade de empreender, que é apaixonante, pois reflete uma liberdade guiada por propósito, e por fim o setor de finanças sociais onde organizações como SITAWI, VOX e MOV., fazem um notável trabalho. É um setor compreendido em entender o mundo que vivemos, partindo do princípio que empatizar é chave para qualquer empreendimento. Acho isso uma delícia. Se colocar no lugar do outro para, se tudo der certo, impactar positivamente a vida das pessoas. Assim como RI, deve-se estar atento a organizações que exageram no discurso e deixam o impacto em segundo, terceiro ou plano nenhum.

Quais dicas você daria para os analistas internacionais que gostariam de trabalhar nessa área?

Diria para aproveitarem a formação multidisciplinar que tivemos (nesse campo vale muito!), para explorarem idealismos de mudar positivamente a vida das pessoas e para que de fato consiga se conectar com problemas que podem ser individualizados. Durante o mestrado senti muito a falta de pensar como aquele pdf de 200 pag. de um thinktank americano afetava realmente a vida de cidadãos em Ghana, no empreendedorismo social a gente consegue preencher mais facilmente esse gap, onde a dor e desafios do mundo realmente estão. Por outro lado, existem muitas possibilidades de consertação em organismos internacionais, grandes empresas e fundações. Tem para todos os gostos, desde que esteja interessado em mudar as coisas. Estudar avaliação de impacto, teoria da mudança e modelos inovadores de negócio são um excelente começo!

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